Filho sem pai…

A tormenta começou a se formar no almoço.
Quarta-feira, dia de feijoada no Bolinha, todos caíram matando na dita, devidamente ante-pastada com muito torresminho crocante e caipirinha com limão amassado, não espremido. Pra acompanhar a suculenta, vários chopinhos sem colarinho e geladíssimos.
Franco, o gordo, meio que exagerou e já estava com aquele olhar de peixe-morto, típico da letargia feijão-alcoólica.

A conversa continuava sendo jogada fora, sobre os assuntos masculinos mais importantes: mulheres, comidas, bebidas, cambalachos e política. Futebol não, que nessa hora dá indigestão. Aí pelas cinco da tarde, “percebendo” os garçons já de saco bem cheio com a nossa companhia, decidimos encerrar o almoço com um último chope.
Mas não podia ser qualquer chope. Tinha que ser um chope especial. O da saideira. Cérebro de bebum funciona em marcha-lenta mas rapidinho, por aclamação, decidimos encerrar no Aerochopp, no aeroporto de Congonhas, ali mais ou menos perto. Conseguimos nos acomodar na “barca” do Gordo (só ele tinha motorista) e, sem maiores estragos, chegamos e conseguimos uma boa mesa, perto do vitrinão, de onde se via boa parte da pista e os aviões chegando e partindo (praia de paulista, ô meu!).
E dá-lhe chope! E o papo? Mulheres, comidas, bebidas e cambalachos. Política não, que final de tarde não é horário para esse tipo de sacanagem.
Tudo o que entra tem que sair, não é? Principalmente os líquidos. O trajeto da mesa para o banheiro rapidamente se tornou o mais concorrido. Numa dessas viagens, voltava eu do banheiro, onde tinha abandonado umas duas canecas de chope, quando reparei que todo mundo na mesa estava sério. Quietos. Estáticos…
Cheguei, sentei e senti o “perfume”. Alguém tinha peidado. Não um peido qualquer, ah não. Aquele era o peido mais fedido jamais expelido por um fiofó de respeito. Pra você ter uma ideia da virulência da coisa, as mesas vizinhas tinham sido desocupadas! Nossa mesa era uma ilha no meio do salão.
Como não poderia ser eu o autor daquela temeridade (felizmente estava no banheiro, pois não?), reclamei com a indignação dos vitimados:
– Mas quem foi o podre que peidou isso tudo?
Alguns filhos não tem pai, você sabe disso. E peido é um desses casos.
– Foi você, não foi, ô paulixta? – Chiou Clézio, o carioca.
– Nunca! Isso daí é traque de mineiro! – Retrucou Júlio, o paulista, apontando para o mineiro.
Rubio, o mineiro, muito calmo, acendeu mais um cigarro, chacoalhou o palito de fósforos para os lados, espalhando a fumaça e mandou um argumento imbatível, que fez o pai da “criança” assumir a paternidade:
– Cês repararam no jeitinho desse peido? Silencioso… Quietinho demais da conta. Pra fazer um estrago desses e não fazer barulho, esse peido passou por uma barriga e uma bunda suficientemente grandes pra amortecer o choque e o estampido. Minha gente, isso aí é peido de gordo!

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